domingo, 13 de outubro de 2013

Professores x Religião x Ateísmo x Ética Profissional

        Ser professora de crianças de cinco a catorze anos envolve uma gama tão extensa de saberes, comportamentos, sentimentos e decisões, que não dá para resumir aqui!
        É também um desafio diário, recheado de situações de conflitos morais, profissionais, éticos e existenciais.
        Ser professora de crianças e ser ateia exacerba essas experiências e essas situações de conflitos para além do descritível. Mas vou tentar:
        Quando os objetivos laicos que deveriam nortear a educação pública são desvirtuados pelas autoridades, colegas de profissão e pais de alunos, pela negação deste desrespeito ao laicismo estatal e pelo policiamento ideológico dentro da escola pública, o conflito ético é inevitável e, quase sempre, não declarado nem sequer debatido.
        Dá-se por vias não oficiais, por persuasão, argumentação da força da maioria e do costume de que sempre se rezou antes das aulas, sempre se vivenciou o Natal, a Páscoa, as Festas Juninas, o Plantio do Milho de São José... E pelo poderoso argumento final: “Os pais não vão gostar”.
        De quê? Das mudanças de abordagem dos conteúdos, das aulas de Ciências negando a Criação Divina, das aulas de História falando em hominídeos peludos e criadores de mitos, das aulas de Geografia mostrando a evolução geológica e negando o Dilúvio e aquela coisa dos seis dias e dos seis mil anos...
        É um conflito que se dá fortemente também pelas vias oficiais, na triste e irrefutável verdade de que a Secretaria de Educação elabora (em conjunto com os educadores) a matriz curricular estadual e municipal...
Determina o calendário escolar, agenda e premia as apresentações dos alunos nas solenidades cristãs lá na Feira de Conhecimentos, no Congresso Tecnológico da Educação, nas Capacitações...
        A religião está presente nas escolas públicas, não só nas aulas de religião, como muitos parecem pensar, sempre que se fala no assunto!
        A escola pública está imersa no Cristianismo ainda pela bagagem religiosa cristã das autoridades da educação, dos professores e professoras, da gestão e do corpo de funcionários da instituição.
        A religião dos profissionais de educação atua como uma força constante, sem adversários, persistente e danosa, agindo de forma aceita e incentivada pelas escolas e pelos poderes públicos; atua no cotidiano escolar e é praticada abertamente pelos educadores, sendo uma inimiga da sua função primeira:
        Estimular e orientar o comportamento científico, no uso do criticismo, na investigação e na apropriação do saber acumulado pela humanidade em sua História. 
        É claro que a religião não entra nas escolas apenas pela atuação dos profissionais de educação (muitas vezes inconsciente, acrítica e desapercebida como um abuso), mas chega à sala de aula através dos próprios alunos, multiplicadores do pensamento religioso de sua família, da sua comunidade e de sua fé.
        Percebe-se que, em questões culturais, a tendência é a tácita imposição das manifestações e normatizações da maioria, já que as outras, minoritárias, são sufocadas, discriminadas e desestimuladas e não se veem representadas no trato social, exceto em seus espaços específicos.
        Que Secretaria de Educação incentivaria e normatizaria manifestações escolares de cunho umbandista, candomblecista ou kardecista nas escolas públicas?
        Seria risco de uma rebelião cristã de professores, gestores e pais de alunos... Sem falar na mídia. O Cristianismo Católico é a cultura religiosa predominante no Brasil. O Cristianismo Evangélico cresce a olhos vistos. É lógico, claro e visível que o Cristianismo é a religião que mais influencia educadores, alunos e pais de alunos.
        Dessa forma, pode-se dizer que o Cristianismo é a religião mais danosa ao estímulo ao saber científico, função primordial da educação sistemática.
        E não me venham dizer que a escola pública é apenas um instrumento governamental de manipulação das populações mais carentes e desprivilegiadas... Isso é um desvirtuamento da função da escola pública, não sua função primeira e eu me recuso a aceitar que será sempre assim.
        O Cristianismo segue contaminando as leis da educação, conteúdos escolares e padrões de mentalidade e comportamento exercidos e alimentados nas escolas. Essa contaminação se dá através do tratamento cotidiano nos espaços escolar e sociais e também nos meios de comunicação de massa, nas ações ou omissões governamentais.
        Estamos cercados pelo Cristianismo na própria atuação daquela bagagem cultural e da normatização de um modo cristão de pensar e ver o mundo e as pessoas, seja de forma consuetudinária estabelecida pela tradição, seja pela força que esta bagagem exerce nas autoridades públicas, nos educadores e no alunado e famílias.

       Para terminar, algumas frases comuns sobre a profissão de professor:        

Magistério é “sacerdócio”. Professores são heróis. Professores deveriam ganhar mais. Sem professores não haveria médicos, advogados, engenheiros...
Professores são formadores de opinião. Professores influenciam os alunos para toda a vida. Professores são exemplos.

        Mas, ouso acrescentar algumas frases minhas: Professores deveriam ser, antes de tudo, proibidos de trazer sua bagagem religiosa para a escola. Deveriam ser treinados para não fazê-lo. Professores deveriam ser profissionais livres para desenvolverem seu trabalho e sua função de orientadores e facilitadores da aprendizagem. Sem a influência antiética e alienante da religião no exercício de sua profissão.

Que aceitem essa influência em sua vida, não é culpa dos alunos.

Postado  por:
J.K.

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