sábado, 2 de maio de 2015

A CERIMÔNIA DO ADEUS


"Cerimônia do Adeus" é o nome do livro em que Simone de Beauvoir conta os últimos dez anos de vida de Jean-Paul Sartre, com quem vivera uma relação amorosa que durou décadas.
A melhor página do livro é a primeira, quando Simone dirige-se a Sartre: "Este é o primeiro livro que escrevo que você não lê por cima do meu ombro." O prefácio começa com uma carta ao amado Sartre, e, logo depois, ela, ateia, põe as cartas na mesa: dirigir-se a Sartre era apenas um floreio literário, pois Sartre não podia mais ouvi-la. Mesmo que os ossos dela se juntassem às cinzas dele, ambos jamais estariam juntos de novo.

Camus disse certa vez que a única coisa no universo que faz sentido é o homem, pois é o único ser que exige um sentido para as coisas. Conhecemos a realidade mediante nossos sentidos e mediante símbolos (a linguagem, por exemplo: o primeiro passo para entender algo é nomeá-lo).

Esta semana perdi um amigo e isso me deixou emocionalmente transtornado. Durante a internação dele, que durou mais de um mês, repetidas vezes pedi a algumas pessoas que fôssemos visitá-lo. Que me chamassem quando fossem visitá-lo no hospital, pois não conheço bem o Rio de Janeiro. Ninguém me chamou e não consegui visitá-lo. Como também não consegui ir ao velório e ao sepultamento.

A minha ficha ainda não caiu. Ainda não compreendi plenamente a sua perda. Diante disso, pedi a um amigo que é padre e sabe de meu ateísmo para celebrar uma missa de sétimo dia em sua memória. Não que eu me preocupe com ele, pois não creio em vida após a morte. Mas para que, durante a cerimônia, eu possa chorar ao lado de nossos amigos em comum e despedir-me dele simbolicamente.

E aí lembro-me de algo que li em algum lugar. Que, quando cientistas encontram restos fossilizados de homens das cavernas, buscam nas proximidades da ossada, restos de algum ritual, para certificar-se da sua condição de humanos, da evolução de cérebros que já buscavam sentidos para o mundo.

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